Espanha: partido propõe modelo de deportações de Trump –

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O partido Vox, da extrema direita na Espanha, tem promovido um discurso racista usando termos como “invasão migratória” e “remigração”, o que implica na deportação de até oito milhões de imigrantes, incluindo cidadãos nascidos no país. Essa ideia, que é semelhante às políticas do ex-presidente americano Donald Trump, visa restringir o direito à cidadania para filhos de imigrantes sem documentos. Recentemente, um tribunal de apelações dos Estados Unidos manteve um bloqueio a uma ordem executiva de Trump que buscava encerrar esse direito, assegurado há mais de 150 anos pela 14ª Emenda da Constituição dos EUA.
O juiz Ronald Gould, responsável pela decisão, afirmou que limitar a suspensão da ordem a alguns estados não seria efetivo, dado que a mobilidade entre regiões com regras diferentes é alta. Embora a Suprema Corte dos EUA não tenha se pronunciado sobre a constitucionalidade da ordem presidencial, ela reconheceu que é possível barrar ações executivas por meio de ações coletivas.
Esse cenário jurídico nos Estados Unidos reforça que há limites constitucionais na Espanha também. Especialistas afirmam que, para que o Vox execute sua proposta, seria necessário mudar a Constituição espanhola, o Código Civil e vários tratados internacionais, incluindo a Convenção Europeia de Direitos Humanos.
Na Espanha, as deportações devem ser feitas com base em decisões individuais que respeitem o devido processo legal. Expulsões em massa, como sugerido pelo Vox, são ilegais. Além disso, a retirada da cidadania de pessoas nascidas na Espanha é praticamente impossível, exceto em casos excepcionais relacionados a crimes graves.
A proposta do Vox não considera o impacto econômico positivo da imigração no país. Com uma população envelhecida e uma baixa taxa de natalidade, a Espanha depende dos trabalhadores imigrantes para sustentar seu sistema previdenciário e manter a economia ativa. Dados do Ministério da Inclusão, Segurança Social e Migrações mostram que 13,7% dos contribuintes da Previdência Social espanhola são estrangeiros, um aumento de quase 900 mil desde 2019. No último ano, 41% dos novos empregos gerados foram ocupados por imigrantes.
Entre os imigrantes não originários da União Europeia, os maiores grupos vêm do Marrocos, Colômbia, Venezuela e China. Lucila Rodríguez, diretora da Fundação PorCausa, alerta sobre o risco de normalização de medidas drásticas, usando a estratégia de “janela de Overton”, que pode tornar propostas extremas mais aceitáveis. Embora a proposta do Vox mobilize seu eleitorado, ela enfrenta barreiras legais e princípios fundamentais da democracia.
A recente violência em Torre Pacheco, que ficou conhecida devido a distúrbios causados por grupos de extrema direita contra imigrantes, exemplifica uma reação aos discursos de ódio. Os conflitos ocorreram após a proposta do Vox de deportar milhões de pessoas e foram exacerbados por um ataque de jovens magrebinos a um homem local. Grupos extremistas, como “Deport Them Now” e “Desokupa”, utilizaram redes sociais para incitar ataques contra pessoas de origem norte-africana, independentemente de seus vínculos com a criminalidade.
Moradores expressaram preocupações com crimes na cidade, atribuídos principalmente a jovens magrebinos, mas também ressaltaram que muitos imigrantes estão integrados e desempenham papéis importantes na economia. Um morador, que preferiu não se identificar, comentou sobre sua experiência com roubos, mencionando que, embora existam criminosos, muitos imigrantes são bons vizinhos e trabalhadores.
Contrariando a percepção de que a imigração aumenta a criminalidade, os dados do Ministério do Interior da Espanha indicam uma queda nas infrações penais. O Boletim de Criminalidade mais recente revelou uma redução de 2,8% nas violações, indicando que a relação entre imigração e criminalidade é mais complexa.
Uma pesquisa realizada pela organização More in Common revelou que os cidadãos espanhóis têm visões variadas sobre a imigração. A maioria se preocupa mais em garantir que a imigração seja bem gerenciada do que com o número de imigrantes. A pesquisa apontou que 44% dos entrevistados veem a imigração como uma necessidade que deve ser administrada; 19% a veem como uma oportunidade e 29% a consideram uma ameaça. Apesar das tensões, a percepção em geral na Espanha é mais positiva, com exceção dos eleitores da extrema direita, que frequentemente associam a imigração a riscos e ameaças.